Conteúdo formativo Professor

Uma saída para os pais que trabalham

Por FTD Educação

Estimativa de leitura: 22min 47seg

22 de julho de 2021

Daisy Dowling

Como se sentir mais confiante, conectado e no controle — durante a pandemia e depois. 

Mau, culpado, fracassado, sozinho. Essas palavras soam familiares? Aposto que sim, porque, nos últimos anos, foram as que mais ouvi nas minhas sessões individuais de coaching com pais que trabalham. E era assim antes da covid-19. 

Nos últimos oito meses, administrar o trabalho e os filhos pequenos passou rapidamente de desafio complexo e contínuo a crise total. Tivemos de lidar com as atividades profissionais em tempo integral, cuidar da casa em tempo integral e supervisionar as atividades escolares de nossos filhos — sem contar com nossos sistemas de apoio normais. Uma de minhas clientes voltou ao trabalho depois de sua primeira licença-maternidade em março e, desde então, trabalhou sem parar, sem nenhuma assistência externa ao bebê. Como acontece com tantos outros pais, ela se pergunta por quanto tempo ainda conseguirá “aguentar”. Outros pais que aconselhei e entrevistei estão tentando descobrir como gerenciar atividades da linha de frente e aprendizado a distância, ou manter seu salário e ao mesmo tempo cuidar de uma criança com necessidades especiais 24/7. 

Acredito ser justo afirmar que em 2020 tivemos baixas de pais que trabalham. Eu não vejo a hora desta pandemia acabar. Sou profundamente grata pelo que tenho — saúde, família, trabalho, um lar — e com absoluta consciência de que para outros é muito mais difícil. No entanto, enquanto escrevo este artigo, com meu laptop sobre a bancada da cozinha, com um olho nos emails dos clientes e outro em minha filha de sete anos que neste momento está terminando a tarefa de matemática, eu imagino como encontrar a porta do alçapão que possa me libertar desta armadilha num passe de mágica. 

Se você está enfrentando o desafio terrível de conciliar carreira com o lar, estou certa de que está sentindo o mesmo. 

É natural se sentir abatido e com saudade da vida pré-pandemia (quem não está um pouco saudoso de 2019?), mas não podemos deixar que esses sentimentos e desejos nos levem ao pensamento de curto prazo. Estamos trabalhando e estamos cuidando dos filhos estamos juntos nesta. E precisamos encontrar formas, ainda que paliativas, de torná-la menos miserável — para retomar algumas medidas de controle. 

Precisamos também começar a criar um modelo de pais que trabalham para quando a pandemia acabar, por mais distante que isso possa parecer. Este novo normal foi estressante, insuportável, opressivo — mas não devemos voltar para o antigo normal porque, por mais cor-de-rosa que ele agora pareça, antes de 2020 a vida para os pais que trabalhavam não era nada boa. Nesta situação terrível, e com tantas mudanças, temos de adotar uma abordagem diferente — que ajude a moldar nossas próprias experiências de pais profissionais. 

No artigo descrevo o que seria paternidade 2.0 [working parenthood 2.0, no original] e apresento alguns passos simples e factíveis para começar — passos possíveis de trazer algum alívio imediato. Vou focar abordagens e ações individuais, ainda que aparentemente contraintuitivas. Apoio estrutural genérico para pais que trabalham — licença-maternidade/paternidade e creche a preços acessíveis, por exemplo — é absolutamente essencial, e não há dúvida de que estamos ficando para trás nesse quesito. Mas nos libertarmos — e ajudarmos a libertar outros — de nos sentir maus, culpados, fracassados e sozinhos é fundamental para diluir o que resta da crise e encorajar as grandes mudanças de que nossa família, organização e a própria sociedade tanto precisam. 

Antes de mergulharmos no 2.0, vamos primeiro analisar como chegamos a este caos. Feito isso, estaremos prontos para começar a encontrar a saída. 

A armadilha do mau, culpado, fracassado, sozinho 
Um dos equívocos mais prejudiciais que ouvi de pais que trabalham — e ouvi todos os dias — é que eles estão se matando, enquanto outros pais estão administrando bem e até progredindo. Em outras palavras: não é só você. O tipo de problema prático que você enfrenta e seus sentimentos mais profundos e frustrantes sobre ele são comuns e totalmente normais. Como uma das poucas pessoas que passou anos sentada do mesmo lado do ringue observando as atuais realidades de pais que trabalham, aposto que estas realidades não são as mesmas com as quais você está se comparando. 

Ao contrário, quando você pensa em “pais que trabalham” talvez lhe venham à mente seus pais ou seus avós, que, apesar de trabalharem para ganhar a vida, se sentavam para jantar com os filhos todas as noites. Ou os líderes seniores de sua organização que, de alguma forma, conseguiam fazer que seus funcionários que eram pais trabalhassem a contento. Ou até os antigos programas de TV que você assistia quando jovem, nos quais os pais equilibravam a vida pessoal e a vida profissional sem muito esforço. 

Essas impressões o levaram a acreditar que isso é possível se eu trabalhar muito ou que bons pais fazem as refeições com os filhos, ou algo assim. Mas é provável que sua vida seja muito diferente do modelo fortemente arraigado de pais que trabalham. Naqueles programas de TV, geralmente um dos pais trabalhava e o outro se encarregava das tarefas domésticas. Atualmente isso só é verdade para 25% das famílias americanas cujos pais trabalham. As demais são formadas por casais em que cada um tem sua própria carreira ou por pai ou mãe solteira. Antigamente era comum os membros da mesma família trabalharem grande parte da carreira na mesma empresa, mas, estatisticamente falando, é provável que você esteja em seu emprego atual há apenas quatro anos — e sentindo a necessidade de atualizar seu perfil do LinkedIn durante o período em que está com a família. E não pense que porque seus modelos inspiradores tiveram filhos antes de 2007, hoje, com o bombardeio de mensagens, pressões e expectativas criadas pelo smartphone, eles já não precisam trabalhar e cuidar desses filhos. Em outras palavras, não pense que a condição de progenitores que trabalham é mais difícil que o modelo que você criou — na verdade é mais difícil sim. Como a pandemia revelou com tanta eloquência, carregamos uma carga extraordinariamente pesada, pois mesmo in extremis somos abandonados à nossa própria sorte e nos prendemos a expectativas irrealistas. 

Esse desequilíbrio é um dos maiores gatilhos do mau, culpado, fracassado, sozinho. Funciona assim: durante o tempo que supostamente deveria ser dedicado à família, você recebe uma mensagem importante de um colega. Você se afasta dos filhos para atendê-lo — pela enésima vez esta semana — e se sente pressionado e culpado: eu preciso responder, mas estou novamente ignorando as crianças. O dilema pode surgir na situação inversa: você se afasta do trabalho para atender um filho doente ou supervisionar a lição de casa. 

À medida que os problemas se acumulam, seus valores — sua identidade — começam a fazê-lo sentir culpa: Por que não resolvi isso? Sempre fui funcionário esforçado. Eu deveria ser capaz de lidar com isso. Outras pessoas conseguem (lembrete: não conseguem.). 

Como você se sente incapaz de “resolver” a situação, a tensão e a autocrítica escalam: que tipo de mãe/pai sou eu, fazendo estas escolhas na carreira e dando pouca atenção aos meus filhos? As crianças precisam de mim, mas meus colegas estão observando. Agindo desta forma eu nunca vou ser promovido. Agora, perturbado com as emoções negativas, você começa a fazer comparações com grandes figuras: meus pais se sentavam para jantar conosco todas as noites. Porque eu não consigo? Eu era excelente profissional e pai presente, mas nesta pandemia não sou nem uma coisa nem outra. 

Tudo começou com um único email, e agora — pronto! — você está se sentindo arrasado, cansado, cheio de conflitos e sozinho. E se você fizer parte de um grupo que não está sempre ativamente incluído no diálogo entre pais que trabalham — se você é genitor LGBTQIA+ ou o único genitor de uma criança maior, por exemplo —, a sensação de isolamento pode ser ainda mais aguda. 

É um péssimo lugar para estar, e quando você está assim perturbado e esgotado, é extremamente difícil ser o melhor pai/mãe do mundo ou ter desempenho espetacular no trabalho. E se todos os 50 milhões ou mais de mães e pais americanos que trabalham (ou de outras nacionalidades) continuarem todos se sentindo maus, culpados, fracassados e sozinhos ou sofrendo de um caso agudo de “por que não consigo fazer este trabalho?”, como poderemos apoiar uns aos outros de forma vigorosa e eficaz ou defender políticas e programas tão necessários? 

Quero deixar claro que não estou sugerindo que nós, de alguma forma, estamos nos culpando pela presente situação dos pais que trabalham, nem isentando corporações, governos e instituições. Mas acredito que, como indivíduos e como colegas de pais que trabalham, podemos contribuir para a solução mudando nossa abordagem. Na paternidade 1.0 nós apertávamos o cinto e nos obrigávamos a fazer as coisas funcionarem, qualquer que fosse o custo. Precisamos parar de fazer isso e sermos mais realistas e autênticos em nossas duplas funções e, ao mesmo tempo, melhores guardiões e defensores de nós mesmos — e uns dos outros. 

Como é a paternidade 2.0 
Apresentamos a seguir nossa visão das vantagens da paternidade 2.0 e explicamos por que é possível conciliar carreira e família de forma viável, direta e satisfatória por meio de algumas iniciativas específicas e poderosas. 
Penso na 2.0 com quatro elementos essenciais: (1) visão franca e sem apologia de si mesmo, como pessoa única, inteira e completa — mesmo quando se desempenham duas funções distintas importantes; (2) conexões mais abertas, frequentes e satisfatórias com outros pais que trabalham (e com colegas que não têm filhos); (3) ampliação das conexões com pais que trabalham; (4) talvez o mais importante: visibilidade e ação. 

Esses elementos são somente o começo, mas hão de eternizar-se. Eles podem nos ajudar a atravessar o que resta da era covid-19 e a tornar muito bem-sucedido o trabalho dos pais e mães, com reflexos para todos nós. Alguns talvez lhe pareçam mais viáveis ou menos, ou até devastadores. Meu conselho: faça o que é possível agora, mesmo que esse possível seja uma ação apenas. Qualquer que seja o caso, trate de levá-la adiante — para você mesmo, seus chefes e colegas, sua organização. 

Para você mesmo. Para evitar o mau, culpado, fracassado, sozinho, desenvolva seu próprio senso de confiança e controle. Há, certamente, várias formas de fazer isso, e se você já descobriu esse exercício, ou talvez uma prática espiritual, tutoria, um hábito qualquer ou uma comunidade que o ajude a manter-se energizado e no comando, então não abra mão desse recurso de jeito nenhum. E acrescente estas duas abordagens, que tanto beneficiaram a maioria dos meus clientes e certamente beneficiará também a você. 

Crie linhas de separação entre trabalho e família. Durante anos alimentamos a ideia bem-intencionada de que é possível conciliar, em perfeita harmonia, as duas esferas da vida, trabalho e família — por exemplo, assistir ao campeonato esportivo dos filhos e, ao mesmo tempo, ficar de olho nas mensagens do escritório que não param de chegar. Infelizmente, e sobretudo agora, durante a pandemia, todas as linhas divisórias desapareceram. É como se não houvesse separação entre trabalho e família. Passamos a maior parte do tempo no modo tela dividida, supervigilantes, esforçando-nos para cuidar dos filhos e a um só tempo entregar as tarefas profissionais, desgastados e, em ambos os casos, com a sensação de ineficiência — isso dói. Está na hora de (re)marcar nossas linhas divisórias. 

Nos próximos dias, trace uma linha entre carreira e filhos, e faça o possível para ater-se a ela. Essa linha pode ser real ou virtual. Se você está trabalhando remotamente, leia as mensagens apenas na sua escrivaninha; pense em si mesmo como profissional “funcional” só quando estiver usando sapatos, e não chinelos; ou decida desligar-se do trabalho em determinada hora todas as noites; se trabalhou o dia todo ou a noite toda na empresa, aproveite o trajeto de volta ao lar para esvaziar a mente e dedicar-se por completo aos seus filhos. 

Você talvez tenha de fazer várias dessas mudanças dia após dia, mas toda vez que o fizer, tente estar completamente presente, seja em uma reunião, seja em uma videoconferência, seja na hora do jantar com as crianças. Se isso parece ambicioso, tente pequenos passos, como ficar longe do celular por 20 minutos todas as noites e, gradualmente, prolongue esse tempo. Você ainda terá muito trabalho pela frente, mas criar essas linhas divisórias pode trazer algum alívio. Separe as coisas e se sentirá mais atento, competente, e mais você em cada esfera. 

Reposicione-se. Provavelmente você foi aconselhado a “livrar-se da culpa de ser pai/mãe que trabalha”. Mas isso é impossível. Culpa é o natural subproduto emocional da ação, mesmo em pequena escala, o qual se contrapõe aos seus mais íntimos valores. Se você acredita no bordão meus filhos em primeiro lugar, mas não cumpre a rotina de pôr seus filhos na cama preferindo cumprir (mais um) prazo de trabalho, sentirá pressão e autorrecriminação. Você não consegue “livrar-se” desse sentimento porque, livrando-se, ou você renuncia a ter seus filhos no centro de sua vida ou, de alguma forma, torna-se impermeável à suas próprias emoções, como um sociopata. O que o ajudará a baixar a temperatura, e o que você pode fazer, é reposicionar-se: finque as estacas de seus valores firmemente, mesmo em situações difíceis. Digamos que você não estava presente na hora de seus filhos irem para a cama porque precisou atender mais uma ligação ou trabalhou além do horário habitual, e eles ficaram magoados. Quando surge a culpa, diga a si mesmo: meus filhos em primeiro lugar, e minha prioridade é estar em casa com eles. Por necessidades profissionais — o trabalho que faço para sustentar nossa família — não estarei presente esta noite quando as crianças forem dormir. Isso não muda meu comprometimento ou quem eu sou. Sou mãe/pai devotada(o), e meus filhos vêm em primeiro lugar. Ao se reposicionar, você reconhece o conflito e a completa realidade do que está acontecendo, mas continua no controle do território emocional. É óbvio que se você está constantemente trabalhando além do horário habitual e em condição interminável de reposicionamento, você terá de recuar. É um reposicionamento honesto, não uma atitude defensiva. 

Se para você é difícil se reposicionar no momento, faça uma pequena previsão. Examine sua agenda da próxima semana e verifique quando poderá naturalmente sentir-se um pouco culpado ou em conflito — nesse prazo, na quarta-feira, por exemplo. Quando chegar o dia e aparecerem os sentimentos negativos, você estará mais bem posicionado para dominá-los. 

Com seu chefe e colegas. Se esta pandemia teve algum resultado positivo, foi a maior abertura (embora forçada) do que significa de fato conciliar a carreira com a vida familiar. Antes da pandemia, você pode ter deliberadamente diminuído a quantidade de “assuntos relacionados aos filhos” que levava para o trabalho e se envergonhado quando eles ligavam interrompendo o seu trabalho. Agora isso já não é possível, então nos tornamos mais diretos, acessíveis, já não ficamos constrangidos perante chefes e colegas por assistir nossos filhos. Como resultado, começamos a perceber que não estamos sós em nossos problemas e lutas. Agora podemos dar os próximos passos para sermos visíveis e “estarmos juntos nesta”. 

Aborde as questões de pais que trabalham em um contexto relacionado à carreira e não à tarefa. Seu chefe viu seu filho de quatro anos correr pela casa durante uma chamada de vídeo. Foi um episódio isolado. Mas como você abordará a “questão de pais que trabalham” na próxima conversa que tiver sobre promoção, avaliação de desempenho ou feedback — ou entrevista de emprego? No passado você provavelmente não teria levantado a questão. Situações como essas teriam sido estritamente profissionais. 

Nas reuniões de fim de ano, quando suas realizações forem discutidas, se você deixar escapar algo que não pretende, talvez até consiga alguns créditos: Em 2020 trabalhei tantas horas quantas no ano anterior, e fiz isso enquanto administrava desafios pessoais significativos na minha condição de pai/mãe de duas crianças. Você não estará se queixando nem se vangloriando: estará simplesmente admitindo a realidade do que realizou. Isso talvez possa parecer embaraçoso — mas foi assim que o meu caçula que mal andava apareceu numa tela pela primeira vez. 

Se você está preocupado com o trabalho, ou está em um setor ou cadeia de comando onde testar os limites simplesmente parece impossível, converse a portas fechadas com um mentor sobre seus planos de longo prazo no que diz respeito à flexibilidade. Ou peça a um colega mais sênior que o oriente como melhor gerir carreira e filhos. Até os colegas mais ríspidos amolecem quando solicitados a dar conselho pessoal. A questão é ajudar a tornar normal um tópico que pode ter sido considerado tabu. 

Seja inclusivo. Um hábito que observei em empresas que favorecem os funcionários que são pais é ajudá-los de forma visível, por exemplo, dando flexibilidade aos que têm filhos pequenos e aos que voltaram da licença-maternidade/paternidade — enfim, aos que mais precisam de ajuda. 

A parte talvez mais difícil de administrar é que os pais que trabalham podem ser homens, mulheres, homossexuais, heterossexuais, biológicos, adotivos; seus filhos podem ser crescidos ou bebês — e todos acabam afetados, ainda que não se toque no assunto. Há que considerar também os que ainda não têm filhos, mas já imaginam que, no futuro, 
terão de conciliar carreira e família. 

Pense então numa forma de atraí-los. Acolha explicitamente “todos os pais, atuais e futuros”. Se você está entrevistando um possível candidato a ser contratado, mencione seus próprios filhos e deixe claro que a empresa valoriza quem cuida dos filhos. Se você está procurando mentores para funcionários que têm filhos, ou quer tornar-se mentor, converse com pais cuja função e perfil diferem dos seus. Se você for mãe recente, aconselhe-se com um pai ou parente de adolescentes. 

Um de meus clientes, uma advogada, surpreendeu-se quando um colega e sócio da empresa lhe deu “o melhor conselho” sobre a transição de um para dois filhos. Independentemente do tamanho, toda nova perspectiva pode ser muito útil. E igualmente importante, você criou um vínculo. Tanto para seu próprio benefício como para o de outros pais, amplie o círculo: encontre formas para enfatizar que estamos todos nisso juntos. 

No nível organizacional. É muito fácil esmorecer quando se é pai ou mãe que trabalha em uma grande organização — principalmente se nela existe pouco diálogo sobre as questões aqui tratadas. No entanto, você pode ajudar sua empresa ou instituição a melhorar seu apoio aos pais. 

Lute pela transparência e pela agregação de benefícios. Muitas organizações optam por projetar e estruturar benefícios relevantes para pais que trabalham — mas falham em transmiti-los de forma objetiva ao beneficiário. Políticas de trabalho flexível, disponibilidade de creche e outros benefícios precisam estar ao alcance dos funcionários e ser de pleno conhecimento dos gestores. Os procedimentos têm de ser simples e claros; os formulários de inscrição, acessíveis – e não escondidos na intranet da empresa. Eu costumo perguntar rotineiramente aos clientes quais os benefícios familiares que suas empresas oferecem, e 95% das respostas é “não sei”, ou “não sei direito como se faz a inscrição”. A transparência melhorou durante a pandemia, mas seria muito melhor se as coisas fossem ainda mais claras. Caso contrário, muitas mães e pais continuarão a gastar tempo e energia e a esbarrar numa série de dificuldades para obter o apoio prático e a tranquilidade de que tanto necessitam. 

Você pode não trabalhar no departamento de benefícios nem na comunicação corporativa, mas pode — construtiva e diplomaticamente — tentar obter seus préstimos. Enviar um email ao RH sugerindo a criação, na intranet, de uma única página intitulada “recursos para pais que trabalham”, com opções de cliques, formulários, explicações e números de contato para obtenção de todos os benefícios relevantes, seria muito útil e apreciado. Essa comunicação completa, adotada por várias empresas com as quais trabalho economiza muito tempo organizacional (incluindo o tempo do pessoal de RH). 

De forma mais básica e pró-ativa, ofereça-se para conversar com colegas de departamento que se tornaram pais recentemente sobre a experiência que tiveram ao usar a creche do centro de apoio, ou informe ao RH que você está disposto a falar numa sessão informativa. Explicar o que deve ser colocado na sacola de fraldas antes de sair de casa ou dizer se você achou a creche bem administrada tranquiliza os pais de primeira viagem. Se você trabalha em empresa de pequeno porte, tente polidamente sinalizar ao empregador o baixo custo de alguns recursos úteis que ele pode oferecer. Talvez sua startup não tenha condição de subsidiar um centro de apoio para cuidar de crianças, mas possa pagar aos funcionários uma inscrição anual em um serviço de babás on demand

Contribua para — ou inicie — um grupo de pais que trabalham em rede. Grupos de funcionários (geralmente chamados de redes de afinidade, grupos de apoio, ou ERGs) para pais que trabalham estão rapidamente se tornando comuns em organizações de grande e médio porte. Se sua empresa não dispõe de um, ou planeja ter um em janeiro de 2021, há boas chances de que ela o faça agora. Se bem organizado, esse grupo pode ser uma forma fácil e livre de se conectar com outros pais com experiência profissional similar à sua para obter conselhos, dicas e encorajamento, e para prevenir a sensação de estar sozinho nisso. No entanto, falta a muitos grupos um foco distinto ou a ideia de como fornecer aos membros valor imediato. 

Você pode desempenhar um papel importante aqui. Se sua organização ainda não tem um grupo, pense em iniciar um. Convide outros pais que você conhece — e outros pais que eles conhecem — de toda a organização para se encontrarem em um horário específico e compartilhem dicas e truques para um desafio comum de pais que trabalham como gestão do tempo ou obter novos mecanismos de assistência às crianças. Se você mantiver os convites abrangentes e as conversas práticas, o grupo provavelmente vai ganhar força. 

Se já existe um grupo, pense em se oferecer para organizar uma sessão direcionada para soluções. Reserve um horário e convide os membros da rede a se reunirem para discutir, por exemplo, os melhores aplicativos para smartphones para pais que trabalham. Ou se você é contabilista, se ofereça para explicar os créditos de imposto relacionados aos filhos (sejamos realistas: poucos de nós realmente entendem disso). Ou convide um “amigo da empresa”, com carreira em educação para discutir alguns aspectos do desafio do aprendizado remoto. Você pode ajudar a criar um canal do Slack para pais adotivos, criar um pequeno subgrupo de voluntários que aceitem receber chamadas de colegas que acabaram de voltar de licença, ou criar um programa informal entre colegas de tutoria para pais que estão pensando em ascensão profissional e em transições. À medida que fornece ajuda prática a outros pais que trabalham e ajuda a normalizar suas inquietações, você também se sente pessoalmente mais empoderado. 

Se tudo isso parece difícil de assumir ou parece muito a pedir de si mesmo neste momento, eu concordo com você. Qualquer dessas medidas parece grande. Juntas, elas são assustadoras. Enquanto me sento curvada sobre minha mesa de trabalho improvisada em casa oito meses nesta pandemia, é difícil imaginar vestir as roupas normais que uso para ir ao escritório — muito menos, me sentir forte e com o pé na dianteira testando novas mudanças como profissional ou como mãe. Até como alguém que orienta outros pais que trabalham como meio de vida. Eu vejo a introspecção, reformulação, modelagem e a defesa necessárias para fazer as mudanças que descrevi tanto ousadas e viáveis como arriscadas e arrebatadoras. E se eu demarcar linhas de fronteira profissionais e for criticada por isso, ou se minha empresa for prejudicada? E se eu me conectar com outros pais inteligentes que trabalham, mas se não conseguirmos apresentar boas soluções coletivas? E se todos nós fizermos o melhor possível e nada mudar? 

Então, na sala ao lado, eu encontro a coragem de que preciso para pelo menos tentar começar. Porque ainda estamos no meio da pandemia e meus filhos estão estudando a distância, minha filha de sete anos assiste às aulas de matemática com meu velho iPad enferrujado. A professora explica associações numéricas: como juntar diferentes componentes e somar pequenas quantidades e usar diferentes caminhos para chegar à resposta desejada. 

Daqui a 30 anos, não quero minha filha presa ao mau, culpado, fracassado, sozinho e você também não quer que seus filhos se sintam assim. Queremos que eles desenvolvam seu potencial máximo, como profissionais, pais e pessoas. E teremos de começar usando novos componentes e seguindo diferentes caminhos hoje para ajudá-los — e a nós — a chegar lá.  


Daisy Dowling é fundadora e CEO da Workparent, empresa especializada em consultoria e coaching e focada em pais que trabalham. Ela é autora de Workparent: The Complete Guide to Succeeding on the Job, Staying True to Yourself, and Raising Happy Kids, a ser publicado pela Harvard Business Review Press, em maio de 2021. 


Conteúdo originalmente publicado na Revista Harvard Business Review, Janeiro de 2021.

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