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O deleite e as dores da superdotação

Por FTD Educação

Estimativa de leitura: 8min 9seg

21 de março de 2022

A chama das altas habilidades, em mãos erradas ou desamparada, pode causar um incêndio devastador, esclarecem especialistas 

Crianças com altas habilidades/superdotação (AH/SD) costumam sofrer durante toda a vida com problemas mentais, de relacionamento e um sentimento de não pertencimento pela falta de diagnóstico e atendimento de especialistas e às vezes indiferença dentro das escolas. Segundo a Organização Mundial da Saúde, 5% das crianças e adolescentes estão nas salas de aula sem reconhecimento de seus potenciais, sem desfrutarem de seus direitos garantidos na legislação brasileira. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 traz quem é esse público e qual o direito do superdotado e sustenta que a criança com altas habilidades/superdotação é público-alvo da educação especial.  

Altas habilidades/superdotação é uma habilidade acima da média em alguma área do conhecimento. Um dos aspectos mais marcantes da superdotação relaciona-se ao seu traço de heterogeneidade. Assim, algumas pessoas podem se destacar num setor, ou podem combinar várias áreas, explica Angela Mágda Rodrigues Virgolim, graduada e mestre em psicologia pela Universidade de Brasília e fundadora do Instituto Virgolim para Altas Habilidades e Superdotação.  

“Destituídas de assistência efetiva, essas crianças têm predisposição para o desenvolvimento de transtornos mentais, como depressão e ansiedade, por isso o processo de reconhecimento é fundamental”, alerta Denise Rocha Belfort Arantes-Brero, presidente do Conselho Brasileiro para Superdotação (ConBraSD). 

O professor é capaz de identificar a superdotação porque está todo dia em contato com o aluno e conhece seu desempenho, estando apto para fazer uma análise comparativa. “Uma professora de matemática é capaz de reconhecer qual aluno se destaca comparado com seus pares etários. E isso é possível para o professor em qualquer disciplina”, afirma Denise Brero, que é também especialista em educação especial para dotados e talentosos pela Universidade Federal de Lavras (UFLA/MG) e doutora em psicologia do desenvolvimento e aprendizagem pela Universidade Estadual Paulista em Bauru. 

Crianças e adolescentes superdotados rompem com a sinergia do ambiente e se destacam, sendo visíveis em sala de aula. Muitas vezes são ignorados por professores que não olham, não escutam e não são sensíveis a isso, esclarece Olzeni Ribeiro, consultora da Unesco e do Ministério da Educação na criação de cursos na área de altas habilidades/superdotação, além de doutora em educação, neuropsicopedagoga clínica e institucional e especialista em altas habilidades/superdotação.  

“Quando peço aos pais para descreverem seus filhos superdotados, a palavra sensível aparece com mais frequência. E a sensibilidade assume muitas formas: os sentimentos são facilmente magoados, são compas­sivos com os outros, tornam-se intensamente protetores e se comovem até às lágrimas, chegando a crises de choro compulsivo. Eles ‘sentem os sentimentos’ dos outros, respondem às críticas de forma intensa e às vezes reagem a estímulos do ambiente como luz, ruído, texturas, poluição do ar e determinados alimentos. O perfeccionismo e a intensidade também surgem com frequência nas descrições dos pais”, descreve Olzeni. 

QUEM AVALIA O SUPERDOTADO?  

“O que precisa ser desmistificado é que a alta habilidade/superdotação não está somente relacionada com o Quociente de Inteligência (QI). O que pesa mais é a história de vida, o que a criança faz, seu desempenho, mais do que a pontuação do QI”, determina Denise Brero. 

Segundo Denise, muitos professores têm receio do aluno superdotado. Sentem-se desafiados. Para a especialista a criança superdotada questiona mais, traz novidades e se interessa por um conteúdo mais aprofundado. Ela expressa que esses alunos enriquecem a turma e cita o médico Joseph Salvatore Renzulli, um dos maiores especialistas na educação de superdotados: “Uma maré crescente leva todos os navios. Mas os superdotados têm que ser olhados na sua individualidade e receber alguma atenção especial para continua­rem a florescer, e encorajados a desenvolver os seus potenciais. Devem se sentir pertencentes, autorrealizados e para que sejam produtores de conhecimento, contribuindo para o desenvolvimento da sociedade”.  

UM SUPERDOTADO NA SALA… E DAÍ?  

Quando há diagnóstico de superdotação, pais e professores devem estar atentos se aparecerem sintomas como desmotivação, vontade de faltar às aulas, dor de barriga e de cabeça, falta de envolvimento e de interesse, tristeza. Ao longo da vida, em alguns momentos, o superdotado precisará de um acompanhamento psicológico para lidar com estas questões – se aparecerem. 

“Como você quer que na escola seu filho seja aceito, entendido e trabalhado se no curso de formação não se fala em altas habilidades/superdotação?”, reforça Angela Virgolim, Ph.D. em psicologia educacional pela University of Connecticut (Uconn) nos EUA, e especialista em psicologia da superdotação pelo National Research Center on Gifted and Talented.  

Essas crianças têm direito a dois tipos de estratégias específicas dentro da escola: o enriquecimento curricular ou a aceleração de estudos. Cada caso é avaliado para definir que estratégia beneficiará mais a criança. O desejo da criança deve ser respeitado e todo o processo acompanhado, pois se trata de uma mudança abrupta. Em muitos casos a aceleração de estudos (pular a série) é positiva, a criança se sente motivada. 

O superdotado que vai bem na escola é chamado de superdotado acadêmico, cujo conhecimento é devorar leituras, escrever muito bem, e a escola adora pois ele não gera demandas, mas é muito prejudicado porque a escola bloqueia o desenvolvimento. “Toda escola no Brasil estabelece um teto de aprendizagem, o que prejudica o superdotado”, aponta Olzeni Ribeiro, autora do livro Criatividade em uma perspectiva transdisciplinar: rompendo crenças, mitos e concepções, publicado com a chancela da Unesco. 

ROTULAR. O QUE HÁ DE BOM NISSO?  

Crianças superdotadas são, por natureza, mais sensíveis. Reagem com mais força e expressão a um ambiente no qual suas habilidades não são percebidas e suas necessidades não atendidas. Podem ter um comportamento social inadequado, revelando hostilidade e agressão com relação aos outros (pais, professores, figuras de autoridade) ou se entregando a atos de delinquência social. 

“Temos um número imenso de superdotados sendo tratados com remédios, que diminuem a energia, a cognição e a intelectualidade da criança. O remédio é um freio para sua inteligência, e sua intelectualidade é destruída” revela Olzeni, pedagoga, há 30 anos atuando na área da educação com altas habilidades/superdotação e outras condições especiais. 

Olzeni alerta: “se um pai e uma mãe levarem essa questão da superdotação para a escola, pelo amor de Deus, não digam que esses pais são vaidosos. A superdotação é genética, não é fabricada. Se não for diagnosticada e devidamente trabalhada esse adulto precisará de terapia, se não chegar ao suicídio”. Crianças com altas habilidades são um precioso recurso nacional que precisa ser protegido, nutrido e desenvolvido. 

Como reconhecer altas habilidades/superdotação

Embora essa condição não apresente um perfil homogêneo, algumas características podem ser percebidas por pais e professores atentos ao comportamento do estudante, como: 

• Desenvolvimento físico precoce: sentar, engatinhar e caminhar antes do normal; 

• Linguagem adquirida mais cedo, rapidamente progredindo para sentenças complexas, grande vocabulário e estoque de conhecimento verbal; 

• Aprendizagem rápida, com instrução mínima (pouca ajuda ou estímulo de adultos);  

• Curiosidade intelectual, com elaboração de perguntas em um nível mais avançado e persistência até alcançar a informação desejada;  

• Grande concentração quando estão interessadas em algo e persistência na busca de seus objetivos; 

• Interesses quase obsessivos em áreas específicas, a ponto de se tornarem especialistas nesses domínios;  

• Super-reatividade: apresentam reações muito intensas a ruídos, dor e frustração;  

• Alto nível de energia, que pode ser confundido com hipercinesia ou hiperatividade, quando são insuficientemente estimuladas – às vezes necessitam de menos horas de sono do que o normal para a idade;  

• Apresentam leitura precoce (por volta dos quatro anos ou antes), com instrução mínima;  

• Fascínio por números e relações numéricas;  

• Boa memória para informação verbal e/ou matemática;  

• Destaque em raciocínio lógico e abstrato;  

• Em decorrência de suas altas habilidades verbais, apresentam alto senso de humor;  

• Frequentemente brincam sozinhas e apreciam a solidão (por não terem outras crianças de sua idade com o mesmo interesse, ou por se sentirem diferentes);  

• Preferência por amigos mais velhos, próximos a ela em idade mental;  

• Interesse por problemas filosóficos, morais, políticos e sociais – podem tornar-se sobrecarregadas por estas preocupações precoces e desenvolverem posturas morais incomuns – como tornar-se vegetariana por escolha própria;  

• Frequentemente apresentam disparidade entre as áreas intelectual, psicomotora, linguística e perceptual, desenvolvendo-se mais rapidamente em uma do que em outra;  

• 80% das crianças superdotadas são extremamente sensíveis de alguma forma. Isso é ruim quando a criança está dentro de um contexto que não a entende e não a aceita, culpando-a por essa sensibilidade exagerada. 


Artigo originalmente publicado na Revista Educação  – Outubro de 2021

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